Divulgação informativa e cultural da Escola Secundária/3 Camilo Castelo Branco - Vila Real

terça-feira, 18 de maio de 2010

EDUARDO MARÇAL GRILO

Depois de ter sido director-geral do ensino Superior nos alvores da democracia (1976-80), após ter presidido ao Conselho Nacional de Educação entre 1992-1995, Eduardo Marçal Grilo foi ministro da Educação no primeiro mandato de António Guterres como primeiro-ministro (1995-1999).
Dado o seu vasto conhecimento em matéria educativa, um conhecimento não apenas teórico mas dos meandros administrativos e dos principais agentes educativos em Portugal – ele que é Administrador da Gulbenkian desde 2000 – foi com natural expectativa que olhámos para o conjunto de reflexões que nos quis deixar, reunidas num conjunto de ensaios intitulado SE NÃO ESTUDAS, ESTÁS TRAMADO, há pouco dado à estampa.
Do que nos quis dizer, gostaria, aqui, de sublinhar dois elementos que me parecem poucas vezes abordados nas discussões sobre educação. Um, tem que ver com o ensino da Matemática, com a falta de eficácia e resultados na explanação das matérias desta disciplina, no nosso país – num texto publicado no Bulletin do International Center for Mathematics. De entre as hipóteses formuladas com vista a explicar o nosso insucesso matemático, Marçal Grilo lembrou como muitos dos actuais professores do 1º e 2º ciclos apresentam percursos escolares de onde a Matemática se encontra excluída desde o 9º ano de escolaridade. Ou seja, que formação de professores, que aprofundamento de conhecimentos falta fazer em áreas nucleares até o seu processo de maturação pedagógica estar concluído? Se preferirmos: farão hoje sentido os nossos currículos e manter-se-ão apartadas as ciências das humanidades, no ensino Secundário? Fará isso sentido? Regressando ao escrito do ex-ministro da Educação, constatamos que a realidade é ainda pior se atentarmos que “no 2º ciclo, a preparação científica dos professores de Matemática é de há muito deficiente, pois trata-se de grupo bidisciplinar Ciências da Natureza e Matemática, para a qual muitos dos docentes desta última têm formação em Ciências Biológicas ou Geografia, uma formação elementar ou nula ao nível superior”. Agora imaginemos que o professor do 1º ciclo do ensino básico que começa a incutir, imaginamos, o gosto da Matemática no nosso filho em tenra idade, afinal, mesmo no 9º ano – se não mesmo no 7º e 8º – obteve a transição de ano sem aprovação na disciplina de Matemática. Como poderá motivar outrem, e fazê-lo com a autoridade natural de quem domina, com à vontade, uma matéria, alguém que fez este percurso? E logo aqui nos vem à memória países nos quais a habilitação ao professorado, logo para o ensino básico, exige um reforço de conhecimentos e competências, como se na idade em que se dão aprendizagens decisivas para o futuro, tivesse que ser o professor dos professores a levar-nos pela mão. De resto, e ainda no campo da Matemática, Marçal Grilo lembra o estudo da OCDE, Reading for Change, que confirma o que sabíamos: sem um bom domínio da língua, sem o gosto pela leitura, as dificuldades de compreensão do que lemos são imensas, e nem a Matemática escapa às consequências de tais lacunas. Em conclusão, “o interesse pela leitura (…) constitui um factor decisivo para o sucesso educativo, sobrepondo-se mesmo ao impacto do contexto social, económico e cultural no percurso escolar dos jovens”.
Um segundo ponto que cremos crucial na explanação deste autor tem que ver com a percepção social da importância da escola e dos estudos, nomeadamente na inserção no mercado de trabalho. Quer dizer, como é que as empresas poderão ser factor de estímulo, acicate para a valorização da escola e do prosseguimento dos estudos? Neste sentido, são avançadas, entre outras, duas soluções (registadas em intervenção em 2007, de um estudo feito para a COTEC e agora reproduzida nesta obra): a) “as empresas deveriam divulgar de forma consistente e continuada a importância que atribuem à formação de base dos seus trabalhadores”; b) “esta divulgação por parte das empresas será paradigmática de uma procura, que actuará como um grande incentivo para a prossecução de estudos por parte das famílias e dos jovens, ao mesmo tempo que constituirá um incentivo junto das escolas e seus responsáveis”.
Quando o melhor da nossa comunicação social nos traz a realidade do país, quando vai ao terreno antes de fazer discursos sobre ele, ouvimos ainda nos dias de hoje – e ainda há dias o Público contava o dia-a-dia no bairro do Aldoar no Porto, numa reportagem que deveria ser de leitura obrigatória, sobretudo para os nossos políticos – e face ao fenómeno do desemprego, frases que os urbanos moderninhos pensavam já não serem possíveis: “então, a minha filha fez o nono ano para quê?”. Embora pense que a importância da escola está genericamente adquirida na população portuguesa, alertas e propostas como as de Marçal Grilo continuam a ser um exemplo de intervenção cívica.

Pedro Seixas Miranda

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